Todos os estresses e influências nocivas induzem alterações moleculares e bioquímicas nas células que resultam em lesão. A resposta celular ao estímulo nocivo depende de fatores como, o tipo de lesão, sua duração e sua gravidade, enquanto que as consequências dependem substancialmente do tipo, estado e adaptabilidade da célula lesada. A lesão é resultante de diferentes mecanismos bioquímicos (FIGURA 1) que agem em vários componentes essenciais das células e, qualquer estímulo nocivo pode, simultaneamente, desencadear múltiplos mecanismos interconectados que lesam as células. As mitocôndrias, membranas celulares, a maquinaria de síntese e empacotamento de proteínas e o DNA do núcleo são os principais componentes afetados pelos estímulos nocivos. Até certo ponto todas as alterações que acontecem às células podem ser reversíveis, mas ultrapassada a capacidade de adaptabilidade é chegado o ponto de irreverssibilidade e a célula lesada não consegue se recuperar e morre. Quando o dano às membranas é acentuado, as enzimas lisossômias escapam para o citoplasma e digerem a célula que perde seu conteúdo resultando em necrose. Em situações em o DNA ou proteínas célulares importantes são lesadas de modo irreparável a célula dispara mecanismos que resultam em apoptose. A apoptose e a necrose são observadas em resposta às mesmas condições.
Figura 1 - Mecanismos bioquímicos da lesão celular
DEPLEÇÃO DE ATP - A ATP é produzida nas células de duas formas, pela fosforilação oxidativa do ADP com redução do oxigênio pelo sistema de tranferência de elétrons nas mitocôndrias e pela via glicolítica na ausência de oxigênio, usando a glicose dos líquidos corporais ou pela hidrólise do glicogênio. As principais causas de depleção de ATP são a redução do suprimento de oxigênio e nutrientes, danos mitocondriais e intoxicação (ex. cianeto). A depleção de ATP e a redução da sua síntese estão geralmente associadas a lesão isquêmica e química. Todos os processos celulares são dependentes de ATP sejam eles sintéticos ou degradativos, assim, os transportes de membrana, sintese de proteínas e lipídios e manutenção da integridade da membrana plasmática são afetados pela sua redução.
- Com a depleção de ATP as bombas de próntos (Na+/K+ ATPase) na membrana plasmática tem a sua atividade prejudicada ocasionando acúmulo de sódio no interior da célula e difusão do potássio para fora, a falha na manutenção do equilíbrio iônico é acompanhado do influxo de cálcio, com efeitos danosos a varios componentes celulares, e água, resultando na tumefação celular, dilatação do reticulo endoplasmático e perca das microvilosidades e formação de bolhas na membrana.
- Com a redução do suprimento de oxigênio a fosforilação oxidativa não acontece e a célula na tentativa de produzir ATP para a manutenção das fontes de energia aumenta a taxa de glicólise anaeróbica, através da glicose proveniente da hidrólise do glicogênio. A glicólise anaeróbica resulta em acúmulo de ácido láctico e fosfatos inorgânicos o que diminui o pH intracelular, o que reduz a atividade de muitas enzimas celulares além de agregação da cromatina na tentativa de manutenção da integridade do material genético.
- A depleção prolongada de ATP causa destruição no aparelho de síntese proteica manifestada pelo desprendimento dos ribossomos do retículo endoplasmático granular (REG) e dissociação do polissomos, com consequente, redução da síntese proteica. Nesta condição também pode ocorrer a produção de proteínas anormalmente dobradas que iniciam uma reação que pode resultar em lesão e morte celular.
DANOS MITOCONDRIAIS - As mitocôndrias são organelas elulares responsáveis pela produção da energia de sustentação da vida na forma de ATP, por essa razão são componentes críticos da lesão e morte celulares. As mitocôndrias são sensíveis a aumento ca concentração de Ca²+ citoplasmatico, espécies reativas de oxigênio (ERO) e privação de oxigênio decorrente de isquemia e ação de toxinas. Além disso, tembém são afetadas por mutações em genes que reaultam em doenças herdadas. Duas são as consequencias principais dos danos mitocondriais.
- A lesão mitocondrial induz a formação de um canal de condutância na membrana mitrocondrial, poro de permeabilidade mitocrondrial, a abertura deste canal leva a perda do potencial de membrana que provoca falha na fosforilação oxidativa, e depleção progressiva de ATP resultando em necrose celular.
- As mitocôndrias possuem proteínas entre as suas membranas internas e externas que ativam vias apoptóticas, incluindo o citocromo c e proteínas que induzem indiretamente aopoptose, caspazes. O aumento da permeabilidade permite o extravasamento destas proteínas para o citosol o que pode resultar em morte por apoptose.
INFLUXO DE CÁLCIO - A concentração de cálcio (Ca²+) livre no meio intracelular é regulada em uma faixa extremamente baixa comparada com o meio extracelular e a sua maior parte encontra-se seuestrada nas mitocôndrias e no retículo endoplasmático. Condições como isquemia e algumas toxinas causam elevação do cálcio citosólico, inicialmente pela liberação do cálcio armazenado no meio intracelular e posteriormente pelo influxo deste através da membrana plasmática.
- O aumento do cálcio no meio intracelular leva a abertura do poro de permeabilidade mitocondrial e com isso a depleção de ATP;
- A elevação do cálcio no meio intracelular leva a ativação de muitas enzimas com efeitos celulares potencialmente lesivos. Entre essas estão fosolipases (danos as membranas) proteases (atuam em proteínas de membrana e citoesqueleto) endonucleases (fragmentação da cromatina com dano ao DNA) e ATPase (intensificando a depleção de ATP).
- Os níveis aumentados do cálcio também induzem apoptose por ativação direta das caspases bem como pelo aumento dapermeabilidade mitocondrial que leva ao extravasamento de proteínas pró-apoptóticas (citocromo c).
Mecanismos interconectados da lesão celular
Embora esses três mecanismos tenham sido descritos separadamente eles ocorrem de modo simultâneo e, interconectados no ambiente celular, participando da cadeia de eventos que pode resultar em necrose e apoptose.
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